Homenagem ao dia dos Médicos do Hospital viValle - Dra. Claudia Mangini

post_face_depoimento_1b_claudia

“Minha residência médica, entre 1987 e 1990, coincidiu com o auge da epidemia da AIDS. Eu estava apenas com 23 anos, era meu primeiro ano de formada e me designaram um paciente em estado muito grave, com insuficiência respiratória e sem possibilidade de reversão naquela época.

O paciente estava muito magro, não conseguia falar e utilizava uma máscara de oxigênio. Percebi que ele queria se comunicar, e tive a impressão de já tê-lo visto, mas não o reconheci.

No horário da visita, fui surpreendida por uma família vizinha da minha mãe e que me conhecia desde os 4 anos de idade. O paciente era poucos anos mais velho que eu e nós havíamos crescido juntos. O pai dele fazia pirulito puxa-puxa e quebraqueixo para as crianças na minha rua e consertava todos os nossos brinquedos. Da minha convivência com ele, eu só tinha lembranças alegres até ali.

Acompanhei sua agonia durante 36 horas e fiz o melhor que pude, mas ele veio a falecer. Eu nunca esqueci a forma como ele me olhava enquanto o medicávamos para aliviar o sofrimento.

Os pais eram idosos, muito simples, e sem nenhuma condição de compreender que seu filho tinha AIDS. No momento de dar a eles a notícia, pensei: ‘Tive muito azar dele cair na minha mão e eu ter que passar por essa situação tão difícil. Eu poderia ter ajudado, mas não precisava ter ficado responsável pelo caso’. Entretanto, o pai dele me disse: ‘Tivemos muita sorte dele ter caído na sua mão e ter sido atendido por alguém que ele conhecia, que foi gentil e atenciosa com ele nessa hora, que se importou em diminuir seu sofrimento.’

Nunca mais olhei para um paciente como se ele fosse um fardo.”